Actividade intelectual e moral - I

Tal como a actividade intelectual, o senso moral depende dum certo estado estrutural e funcional do nosso organismo. Esse estado depende tanto da constituição imanente dos nossos tecidos e do nosso espírito como dos factores fisiológicos e mentais que agiram sobre cada um de nós durante o nosso desenvolvimento.

Em “O Afundamento da Moral”, Shopenhauer observa que os seres humanos têm tendências inatas para o egoísmo, para a maldade ou para a piedade.

Há, como diz Gallavardin, os puros egoístas, aos quais tão indiferente é a felicidade como a infelicidade dos seus semelhantes; há os que sentem prazer vendo o infortúnio ou o sofrimento dos outros; há finalmente os que sofrem verdadeiramente com os sofrimentos dos outros seres humanos.

Este poder de simpatia gera a bondade, a piedade, a caridade e os actos inspirados por essas virtudes. (Solidariedade Social, em suma). A capacidade de sentir os sofrimentos alheios dá origem ao ser moral, que se esforça por diminuir a dor e o peso da existência entre os homens.

Cada um de nós nasce bom, medíocre ou mau. Mas, assim como a inteligência, o senso moral é susceptível de ser desenvolvido pela educação, pela disciplina e pela vontade.

A definição do bem e do mal baseia-se simultaneamente na razão e na experiência milenária da humanidade, e corresponde a exigências fundamentais da vida individual e social.

Em certas particularidades é arbitrária; mas deve ser a mesma para todos os indivíduos em cada época e em cada país.

O bem é sinónimo de justiça, de caridade e beleza. O mal, de egoísmo, de maldade e de fealdade. Na sociedade moderna, as regras teóricas de comportamento baseiam-se nos vestígios da moral cristã; mas poucos lhes obedecem.

O homem moderno rejeitou tudo o que pudesse disciplinar os seus apetites. Contudo, tanto a moral biológica como a industrial não têm valor prático, porque são artificiais e só têm em conta um aspecto do ser humano, ignorando as actividades psicológicas essenciais. Não nos dão uma armadura suficientemente forte para nos proteger contra os vícios imanentes.

A fim de conservar o seu equilíbrio mental e até orgânico, cada indivíduo deve impor-se uma regra interior. O Estado pode impor pela força a legalidade, mas não os princípios morais.

Cada um deve compreender a necessidade de praticar o bem e de evitar o mal, e submeter-se a essa necessidade por um esforço da sua própria vontade.

Quando se observam os habitantes da cidade moderna, vê-se a necessidade prática do senso moral. Inteligência, vontade e moralidade são funções muito próximas umas das outras. Mas o senso moral importa mais que a inteligência.

Quando ela desaparece duma nação, toda a estrutura social começa a desagregar-se.

Na sociedade moderna raramente temos ocasião de observar indivíduos cujo comportamento seja inspirado por um ideal moral. Contudo, tais indivíduos ainda existem; é impossível deixar de os notar quando se encontram.

A beleza moral deixa uma recordação inesquecível àquele que a contemplou, por uma só vez que fosse. Impressiona-os mais que o belo na natureza, ou na ciência; aumenta a força da inteligência; promove a paz entre os homens. E é, muito mais que a ciência, a arte ou a religião, o fundamento da civilização.