Reconstrução do homem - I

Nesse momento, o único obstáculo será a nossa inércia, e não a incapacidade da raça em ganhar nova vida.

Com efeito, a crise sobreveio antes que a corrupção, a ociosidade e a efeminação destruíssem completamente as nossas qualidades ancestrais.

Sabemos que a apatia intelectual, a imoralidade e a criminalidade são, em geral, caracteres que não se transmitem hereditariamente.

A maior parte das crianças tê, ao nascer, as mesmas potencialidades que seus pais. Para se desenvolverem as suas qualidades inatas basta querê-lo.

Temos à nossa disposição todo o poder do método científico, e entre nós ainda existem homens capazes de o utilizar desinteressadamente.

A sociedade moderna asfixiou todos os focos de cultura intelectual, de coragem moral, de virtude e de audácia.

O mal não é, portanto, irreparável. Mas a renovação dos indivíduos exige a das condições da vida moderna. É impossível sem uma revolução.

Não basta, pois, compreender a necessidade da modificação e possuir os meios científicos de a realizar: é também necessário que o desmoronar espontâneo da civilização tecnológica desencadeie, na sua violência, os impulsos necessários a essa modificação.

Teremos ainda energia e perspicácia suficientes para esse gigantesco esforço?

À primeira vista, parece que não. O homem moderno caiu numa completa indiferença por tudo, excepto pelo dinheiro.

Há, contudo, um motivo de esperança. Afinal, a raça que construiu o mundo actual não está extinta.

No plasma germinativo dos seus descendentes degenerados existem ainda as potencialidades ancestrais, as quais são susceptíveis de actualização.

É certo que os representantes dos ramos mais enérgicos e nobres da raça estão abafados pela multidão dos proletários, cujo número foi aumentado às cegas pela indústria.

O seu número é reduzido, mas não é isso que se há-de opor ao seu sucesso, pois possuem, no estado virtual, uma força maravilhosa.

Devemos lembrar-nos do que se fez depois da queda do Império Romano.

No reduzido território dos Estados do Oeste da Europa, no meio dos combates incessantes, das fomes, das epidemias, conseguimos manter, durante toda a Idade Média, os restos da cultura antiga.

Durante séculos e séculos de obscuridade, o nosso sangue correu por todos os lados em defesa da cristandade contra os inimigos do Norte, do Leste e do Sul.

Graças a um imenso esforço, conseguimos libertar-nos do sono islâmico. E depois deu-se o milagre: a ciência brotou do espírito dos homens formados na disciplina escolástica.

E, coisa ainda mais extraordinária, os homens do Ocidente cultivaram a ciência, por si própria, pela sua verdade e beleza, com um desinteresse absoluto.

Em vez de vegetar no egoísmo individual, como no Oriente e sobretudo na China, a ciência, em quinhentos anos, transformou o nosso mundo. Os nossos antepassados realizaram uma obra sem igual na história da humanidade.

Os homens que, na Europa e na América (norte e sul), deles descendem, parecem ter esquecido a história. O mesmo sucede àqueles que hoje se aproveitam da civilização material que nós construímos.

Somos capazes de empreender de novo aquilo que já realizamos uma vez. Se a nossa civilização se desmoronasse, construiríamos outra.

Não será preciso atravessarmos o caos para atingir a ordem e a paz? Poderemos erguer-nos de novo, antes de termos sofrido a sangrenta provação duma subversão total?

Seremos capazes de nos reconstruirmos, evitando os cataclismos iminentes, e continuar a nossa ascensão?