O sono
O homem moderno ou dorme de mais ou de menos. Adapta-se mal a dormir dse mais, e, pior ainda, a não dormir durante períodos prolongados.
O hábito de resistir ao sono é, contudo inútil. A luta contra o sono põe em movimento aparelhos orgânicos cujo vigor se desenvolve com o exercício. Exige também um esforço da vontade, que, como muitos outros, foi suprimido pela vida moderna.
Apesar da agitação da existência, da falsa actividade dos desportos e dos transportes rápidos, os nossos grandes sistemas reguladores conservam-se inactivos.
Em suma, o género de vida criado pela civilização científica tornou inúteis mecanismos cuja actividade foi, durante milénios, incessante em todos os seres humanos.
O exercício das funções adaptativas parece ser indispensável para o máximo desenvolvimento do indivíduo.
O nosso corpo acha-se num meio físico cujas condições são variáveis. A constância do seu estado interno mantém-se graças a uma incessante actividade orgânica, actividade que não se localiza num único sistema.
Todos os nossos aparelhos anatómicos reagem contra o mundo exterior no sentido mais favorável à continuação da nossa vida. Será então possível que uma propriedade tão geral dos nossos tecidos se conserve virtual, sem que daí nos venham inconvenientes?
Pois não estamos nós organizados para viver em condições mutáveis e irregulares? O homem atinge o seu maior desenvolvimento quando exposto às intempéries, tendo de vencer o sono e dormindo depois longamente, quando a sua alimentação é umas vezes abundante, outras parca, quando conquista com esforço um abrigo e alimentação.
É também necessário que exercite os seus músculos, que se fatigue e descanse, que combata e sofra, que seja por vezes feliz, ame e odeie, que a sua vontade alternadamente se tenda e distenda, que lute com os seus semelhantes ou consigo próprio.
É para viver assim que está constituído, tal como o estômago para digerir os alimentos. É quando os processos de adaptação se exercem com mais intensidade que se torna mais viril.
Sabe-se quanto são sólidos, física e moralmente, aqueles que, desde a infância, estiveram submetidos a uma disciplina inteligente, que sofreram certas privações e tiveram de se acomodar a condições adversas.
Podemos observar, contudo, indivíduos que se desenvolveram plenamente, sem que tenham sido obrigados pela pobreza a lutar pelo seu meio.
Em geral, estes indivíduos também se conformaram, embora diferentemente, ás leis de adaptação. Impuseram-lhes desde a infância, ou impuseram-na eles a si próprios, uma disciplina, uma espécie de ascese, que os preservou dos efeitos deletérios da riqueza.
O filho do senhor feudal era submetido a um duro treino físico e moral. Os filhos dos grandes industriais do século XIX, tanto nos Estados Unidos como na Europa, perderam muitas vezes a força ancestral por não terem de lutar contra o meio. Hoje, é melhor nem falar disso.
Não se conhece ainda completamente o efeito da carência das funções adaptativas sobre o desenvolvimento dos homens. Há hoje nas grandes cidades muitos indivíduos, nos quais estas funções quase não são utilizadas.
As consequências deste fenómeno mostram-se muitas vezes com clareza, não só nos filhos dos ricos, mas também naqueles que são educados como os ricos.
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