O alcool

Só depois do século XV é que este líquido, volátil e combustível (até então conservado como filtro entre os árabes, que não o bebem, pois a sua religião o proíbe) foi conhecido dos europeus.

Cinco séculos de predomínio nas chamadas nações civilizadas, bastam para estabelecer o cadastro horrível de tão enervante bebida.

Não é preciso ir muito longe para se saberem os resultados assustadores, determinados pelo uso do álcool nas populações.

Acolá, dentro das masmorras sórdidas e infectas, vivem criaturas que são nossos irmãos. Quem lhes pôs nas mãos a arma assassina ou os tornou ladrões dos bens estranhos e da honra alheia?

Além, no asilo, crianças idiotas, surdas-mudas, taradas, vegetam, atrépsicas e inúteis. Quem causou tal desordem na infância que devia ser florida e viçosa como uma planta odorífera?

Passam ali, pela rua, a horas mortas, criaturas cambaleantes, ignóbeis, infames, prostituídas e envelhecidas. Quem as tornou assim, a tantas mulheres vendidas ae tantos homens sem brio e sem vergonha?

Uma e sempre a mesma origem tem tanto desvario. O álcool, vestindo-se à cor da abóbada celeste: eis o causador de todo esse estendal de misérias físicas, morais e mentais.

O álcool, seja bebido em cerveja ou vinho, aguardente ou whisky, é sempre o mesmo flagelo. Gera uma enfermidade que é a mais terrível das taras da humanidade civilizada actual. O álcool e as drogas matam mais de 15% da humanidade, deteriorando de forma perene mais de 12%.
O alcoolismo, ou, por outras palavras, a embriaguez do século, manifesta-se na infância quando o líquido perturbador é ingerido.

Desde logo o estado psíquico de quem o bebe se altera: o hábito instala-se e acompanha à cova o delinquente, se não aparece, numa hora propícia, o remorso a ferir a consciência, para a encaminhar na senda do dever e da virtude.

O álcool, porém, tem tanto poderio, que apresentá-lo no pelourinho não é do agrado de quase ninguém.

Uns fazem cervejas; outros fazem vinhos e seus derivados licores! Estes vendem-no; aqueles compram-no; aqueloutros bebem-no!

Poucos são os indivíduos que tenham uma existência liberta da cadeia alcoólica. Tal o motivo por que não quererão ouvir as nossas “blasfémias”.

Mas na sequência dum dever a cumprir, não podemos calar os erros determinados pelo uso do álcool. Em nome da ciência, da moral e da higiene, condenamos o álcool, assassino e burlão, pérfido e ruinoso.

O álcool faz, nos nossos dias – dizia Gladstone – mais estragos que os três flagelos históricos: a peste, a fome e a guerra. Mais que a fome ele dizima; mais que a guerra ela mata; mais que a morte ele desonra.

E para terminar o processo de tão grande perturbador, transcrevemos as palavras do grande pensador francês, Catulo Mendes, tão amigo que foi de Portugal: “Conheces-me? Sou o príncipe que aparece nas alegrias, o companheiro de todos os gozos modernos, o mensageiro da morte, o princípio que governa o mundo. Fabrico os crimes, faço nascer nos corações os pensamentos maus, mancho os lugares, sou pai dos filhos sem pai, enveneno a razão, trago a desonra, a depravação, os suicídios, a loucura, o crime em todas as formas imagináveis. Aspiro a converter o mundo num hospital, num manicómio, num circo, onde estejam encerrados os tigres, asnos, porcos, abutres, hienas. Quero sangue, ruína, dissolução, desespero…”

O álcool não é a água da vida, é o veneno da morte!