O tabaco

Contrariamente ao álcool irritante, ao café e ao chá provocadores, o tabaco deprime e, de certo modo, humilha. Na despropositada senda em que a humanidade se abastarda, o uso do tabaco, cada dia mais desenvolvido, é um factor de importante estigmatização.

Desde o mísero operário, ganhando um salário que mal lhe chaga para comer, até ao grande capitalista, desde o estudante até ao professor que o devia ensinar a pôr de lado esse costume infelicitante; pode dizer-se que é uma raridade encontrar um homem ou uma mulher que não junte ao infortúnio dos seus erros higiénicos o senão deteriorador do tabaco.

É considerado um delito sanitário, usar na boca a chaminé dum cachimbo com o seu fornilho a arder em volutas de fumo atordoador e irritante; prender entre os lábios, onde tantas vezes o cancro mortífero se instala, o rolinho dum cigarro inútil; trazer na boca com o intermédio duma boquilha de âmbar ou de massa um charuto; mascar as folhas ressequidas da solanâcea estupefaciente, ou meter nas fossas nasais o pó do rapé, seu derivado sórdido. É útil para quem o cultiva, fabrica e vende, mas para quem o chupa, absorve e rumina é verdadeiramente insensato.

Este vício não veio para a Europa senão quando foi descoberta a América.

Quase parece um absurdo entrar na avaliação mundial do somatório de deformações psíquicas causadas pelo tabaco.

Alguns chegam a preferi-lo ao alimento, e há até quem, tendo no bolso uns magros cêntimos, em vez de ir buscar um pão que lhes mitigue a fome, antes corre ao estanco próximo para comprar alguns cigarros, com os quais vai esquecer a vida infortunada que tem adquirido pela sua desordem na existência.

No orçamento individual do homem deste século, o tabaco ocupa um lugar importante. Calculando que 5,5 milhões de portugueses gastam 3 euros por dia em tabaco, perfaz por ano mais de 16,5 milhões, que se movimentam por esse dispêndio irracional.

O tabaco destrói a sensibilidade, mascara o olfacto, enfraquece a memória, produz vertigens e causa cegueira (Camilo Castelo Branco cegou por ser um fumador incorrigível).

No tabaco encontra-se a nicotina. Em cada quilo de folhas há 16 gramas desse activo princípio, tão forte como a pérfida morfina ou como a estriquinina usada para matar ratos.

O seu nome deriva de Nicot, embaixador francês em Lisboa, que levou para França, em 1560, esse costume.

Os primeiros fumadores forram corridos, escarnecidos e até o papa Urbano II chegou a excomungar os que fumavam.

Apesar de tudo, o tabaco é dum uso universal entre homens e mulheres.